25 junho 2009

Sou viciado em notícias. Canais de notícias, pequenos noticiários, portais de notícias. Eis que, vendo um jornal local, o apresentador fala, no final, que no jornal seguinte, de âmbito nacional, seriam dadas mais informações sobre o estado de saúde do Michael Jackson. Não estava sabendo disso, e liguei direto na Band News, um dos meus canais preferidos por ser de notícias e por ter várias faixas de informação passando ao mesmo tempo, com as mais importantes circulando numa berrante faixa vermelha. Uma imagem de helicóptero mostrava o hospital no qual ele está internado, e dizia-se a cada minuto, com o cuidado de trocar as palavras a cada intervalo desses para não cansar o telespectador, que uns diziam que ele estava em coma, outros que ele estava morto. Fiquei hipnotizado por alguns minutos até começar a pensar sobre o porquê de estar vendo aquilo. Não tem utilidade saber que o Michael Jackson está morrendo. Eu nem gosto dele. Pus na Globo News, meu segundo canal preferido de notícias porque, apesar de não ter uma faixa com as notícias mais sensacionais em vermelho, eu sei a hora em que o jornal começa (a cada hora redonda). Dou de cara com a mesma imagem de helicóptero do hospital no qual ele estava. Fiquei meio apreensivo. Pus nesse canal para testar a popularidade da notícia, mas não esperava encontrar até a mesma imagem. Pus na CNN, que só não é meu canal preferido de notícias porque os âncoras não facilitam no inglês para estrangeiros. Surpresa: a mesma imagem de helicóptero do hospital no qual Michael Jackson está, com um âncora falando as mesmas informações dos canais anteriores, mas intercaladas com algumas expressões de surpresa, além de uma grande faixa amarela escrito "Breaking News", uma faixa preta falando que ele provavelmente está morto (mas que nada está confirmado pela CNN), e uma outra faixa dando detalhes como o remédio dado a ele pelos médicos. Dada a amplitude da notícia, pus na Fox News, canal norte-americano que não se propõe a ser internacional, mas sim a ser sensacionalista. A imagem estava dividida entre o âncora falando as mesmas informações dos canais anteriores e imagens de arquivo do Michael Jackson. Não acreditei na amplitude de uma notícia que eu não acredito ser tão, tão importante. Como último recurso, já tentando fugir dessa notícia sentindo uma espécie de medo, pus na BBC World News, canal local reservado a notícias européias. A mesma imagem de helicóptero de quase todos os canais anteriores revelou-se na tela, com uma faixa vermelha noticiando a morte de Michael Jackson. Lembrei da Record News e fui direto para ela, com o medo aumentando. A imagem de helicóptero.
Minha irmã chegou em casa falando ao abrir a porta "O Michael Jackson morreu! Não acredito! Põe no Multishow que tão passando todos os clipes dele!" Pus, e dei de cara com o final de Thriller, no qual o Michael Jackson está com olhos verdes brilhantes, como os de um monstro, com a tela se aproximando de sua cara enquanto uma risada diabólica envolve a cena.
Minha nascente posição crítica sobre a notícia transformou-se em medo. A última vez que vi algo do tipo acontecer foi nos atentados de 11 de setembro, que exerceram o impacto que exerceram. Tenho medo do que possa acontecer depois da morte de Michael Jackson.

(Devolvi na CNN. Uma mulher na porta do hospital diz para o repórter "Estou tão triste... ele criou o moonwalk, é devastador", e chora.)

07 junho 2009

Capítulo XXIX: o Imperador.

Fui comprar uma blusa. A que eu queria não tinha no meu tamanho. Enquanto eu esperava um funcionário procurar a G no estoque, imaginei uma situação toda. Como ele achou, esqueci tudo. Cheguei no caixa. Ouvi "Vamos fazer um cartão da loja, senhor?", e isso me subiu o sangue.
Há um tempo resolvi fazer esse cartão para ter descontos na compra. Para fazê-lo, era preciso ter pelo menos o RG, e nem com isso eu estava. Doida que estava a vendedora pensando em sua comissão, aceitou a carteirinha da faculdade para começar o processo. Ela disse para mim e depois ficou repetindo para si mesma, "Eles precisam abrir uma exceção...". Me passaram para mãos mais burocráticas. Depois de um olé de mais de uma hora, recebi a notícia de que meu crédito não tinha sido aprovado, e que eu poderia tentar novamente só depois de um mês. Saí da loja dando juras de desamor a ela, juras de nunca mais voltar. E lá estava eu na boca do caixa. Voltei.
"Não, vocês já me recusaram crédito uma vez", respondi, com esperanças de ter vencido a ambição da moça. Ela perguntou "Mas há quanto tempo isso aconteceu?", e fez uma cara analítica e confiante. Analítica porque a minha resposta era o x de uma equação que ela já tinha pronta na mente, e confiante porque ela sabia resolvê-la. Ao invés de dizer o x, já respondi a equação toda: "olha, foi há mais de um mês, mas eu não quero saber desse cartão, vocês terem recusado crédito foi uma humilhação pra mim". "Moço..." Paguei, disse obrigado para a caixa que não tinha a ver com a situação, fui embora nervoso. Por causa disso, a tal "situação toda" imaginada voltou, e maior.
O funcionário chegou e disse "Não tem G". Eu disse "Quero falar com o seu gerente". Aí já estava eu falando para o gerente "Como vocês podem só pôr blusa M na loja? Vocês querem perder essa compra? E vocês devem ter um lucro enorme com essa blusa, 80 reais?, deve ser uns 20 para fabricá-la, é época de frio, essa marca só é distribuída por vocês, senão eu já estava fora daqui, só o monopólio pra fazer uma loja manter um atendimento desses". Ele descaradamente perguntou "E o que você quer que eu faça?", e eu "Eu tenho cara de consultoria? Se você quer que eu te ajude me contrata!", e depois que eu falei onde estudava e meu curso, ele me contratou. Saí ligando para pessoas radiante, "Arranjei estágio do jeito mais louco possível!", e de repente caí na real. Eu estava me sentindo feliz de verdade, como se tudo isso tivesse acontecido, sendo que eu estava era dentro dum busão, segurando uma sacola com uma blusa G dentro, tão ali quanto cada pessoa ali.
Isso vive acontecendo comigo, e não sei o que isso significa. Eu vejo algo acontecendo e imagino n situações decorrendo daquilo, paranoicamente. Nessas eu já me imaginei, por exemplo, sendo morto a tiros, queimado, esmagado, degolado; matando várias pessoas de diversos modos, desde soltando a mão dela na beira de um precipício, até metendo um carro que eu dirigia num obstáculo qualquer para o passageiro voar; sendo assaltado, e reagindo de diversas maneiras, às vezes morrendo, às vezes sendo ferido e levado pro hospital, às vezes me dando bem; tendo coragem de falar o que eu penso e obtendo a resposta que vai me garantir felicidade pela vida inteira (ilusão dentro de ilusão); morando no meu AP dos sonhos; sendo bem-sucedido no trabalho; et cetera. São coisas terríveis e maravilhosas.
Não sei bem o que concluir desses "momentos". Porém, encontrei uma explicação simples do porquê de isso acontecer: "Não, a imaginação de Ariosto não é mais fértil que a das crianças e dos namorados, nem a visão do impossível precisa mais que de um recanto de ônibus." Eu sou normal, o problema é o tal recanto. Ou pelo menos não sou louco sozinho.